O Quinto Impérioby marcia |
Por Andrew Amaral.
O ano é o de 1139, o local, o campo de batalha em Ourique (sul de Portugal), a visão de Jesus Cristo e dos anjos prenuncia a Dom Afonso Henriques, até então somente conde de Portucália, que a vitória sobre os infiéis, no caso os mouros, estava garantida, e que a partir dele, um grande império seria edificado.
Dom Afonso Henriques vence, e com o espicaço da vitória, posteriormente, se proclamaRex Portugallensis (Rei dos Portucalenses ou Rei dos Portugueses). O condado se tornaria um pequeno reino europeu, o primeiro sob a forma de Estado Moderno, apesar de estarmos ainda na Idade Média. Ratificar a autonomia do reino levou Dom Afonso Henriques, e outros seus sucessores, a outras vezes mais, provar da promessa no campo de batalha. A gente bravia, que nem sempre tinha a seu favor um efetivo numérico considerável, transpassava as dificuldades com audácia, na certeza que cada luta trazia consigo uma oportunidade de reafirmar a santa e sagrada promessa do surgimento de um grande império.
A crise da sucessão do trono (1383-1385) levaria, por pouco, à derrocada da visão triunfal. Ascende à figura do Mestre de Avis, intitulado como Dom João I, que com o suporte do imbatível Santo Condestável, Nuno Álvares Pereira, dá cabo as esperanças de Castela em absorver o reino vizinho, ao menos por enquanto. Assim vai começar a dilatação do reino, e o marco dessa nova era seria a conquista de Tânger, um importante entreposto comercial africano. Tânger seria a primeira conquista das muitas que se sucederam nos quatro cantos da terra. Dom Afonso V, cognominado de “O Africano”, vai consolidar seu nome sob o signo de suas conquistas, e se não fossem estas a memória de suas prodigalidades não poderiam ser minoradas. O nome de Portugal vai se consolidar na historiografia mundial com o advento das grandes descobertas, e se não fosse a incredulidade de Dom João II, que não se deixou convencer pela pessoa de Cristovam Colombo[1], poderia ter sido atribuído ao rei de Portugal o senhorio de toda a América.
Mas apesar do fato da descoberta do Novo Mundo ter sido encetada em nome da coroa castelhana, Portugal não ficou atrás. Dom Manuel, o Venturoso, teve a graça de em seu reinado ver prosperar a política e investimento de grandes vultos, tais como o Infante Dom Henrique, e os esforços dos impávidos argonautas portucalenses. O descobrimento do Brasil trouxe ao reino de Portugal a feição que todo império carece: a grandeza e esplendor de seus domínios. Já no inicio de seu desapontável reinado Dom Sebastião, pode-se dizer sem sombra de dúvida, era o monarca europeu mais promissor em termos de posse. Entretanto, a máquina pública estava encerrada nos arcaicos sistemas medievais que predominavam numa época de intenso comércio, que iria cimentar o contexto da Revolução Industrial. Portugal foi um Império, na há dúvida, um Império que nasceu no rebento de suas conquistas, mas um Império frágil a si mesmo.
Nos confins do mundo, no interior de uma inculta capitania ecoava a voz de um Ilustre pregador. O que ele apregoava: o surgimento de um grande império. Seria, como professo nas Escrituras Sagradas, O Quinto Império[2]. Esta voz eloquente se exaltava contra a desgraça que se assolou sobre Portugal. A União Ibérica construiu um novo império, mas aos olhos do Padre Vieira, isso tudo não passada de uma usurpação, e como ele todos os portugueses, com exceção dos oportunistas de plantão (sempre houve e sempre haverá), não conformavam com aquilo que parecia mais um cativeiro, à moda hebraica.
O tempo era mais que propício à reverberação das Lamentações de Jeremias, mas, ao invés de rememorar as tristezas e perseguições, um sonho era acalentado com a fúria titânica de um povo inconformado. Será que a profecia anunciada a Dom Afonso Henriques não passou de uma quimera? Não, isto é impossível, pois a glória Portugal não estava sepultada pela ambição dos filipes. Não, um Império estaria por emergir das entranhas de um cativeiro ignominioso...As adversidades seriam somente o pretexto para a mobilização de um exercito invencível, que poria termo à heresia castelhana e que se ergueria aos píncaros da glória.
Não resta dúvida, hoje, que Portugal não é, e nem tão pouco dá impressões que se tornará um dia um Império. O Brasil, entretanto, vive há séculos a promessa de um futuro promissor, um futuro tão grande quanto sua extensão territorial, e tão rico como sua natureza. Mas podemos nos perguntar hoje: O caminho que percorremos está a nos levar aonde? O que fará do Brasil um império de verdade? Seria a retificação do título República Federativa do Brasil, por Império do Brasil, o início de uma nova ordem? Aliás, não tão nova...Já fomos um Império, repleto de “glórias”, de homens sábios e filósofos, de grandezas em titularia e de palácios, mas isso foi mais efêmero do que a grandeza de Portugal. Diz o ditado que a barba não faz o filósofo, tão pouco a mudança de regimes ou formas de governo fará com que o Brasil se torne uma potência instantânea. É inconcebível a concepção de um império sem grandeza, e da mesma forma que é impossível o desenvolvimento econômico e social sem investimento em educação e infraestrutura. Estamos cheios de lugares-comuns, vivemos em dias propícios a tais, mas nos esquecemos que a responsabilidade recai sob aqueles que não se esquivam em sonhar com o Império utópico e verdadeiro, Império não dez séculos, ou sessenta e sete anos, mas um Império que desponta no horizonte dos que lutam pela justiça e encaram a cada dia o mal maior da indiferença, porque o futuro está a nossa frente...
Em tempos de crise, em que vivemos, as promessas fugazes se juntam aos falatórios insanos, e a República das Bananas, aliás, alguém já disse: dos macacos, caminha espelhada na grandeza de um passado tão pouco lembrado, de um presente nada ardoroso e um futuro, sabe se lá, o que será, mas que todos sonhamos que seja glorioso.
Padre Antônio Vieira: o Quinto Império.
[1] Sugestão de leitura: “Dom João II”, Mário Domingues.
[2] “Vio Nabucodonosor aquella prodigiosa estatua, que representava os quatro Impérios dos Assírios, dos Persas, dos Gregos e dos Romanos; o corpo estala descuidado, com os sentidos presos, & a alma andava cuidadosa, levantando, derrubando estatuas, fantasiando Reynos, Monarquias. Mais fazia Nabucodonosor dormindo, que acordado: porque acordado cuidava no governo de hũ Reyno, dormindo imaginava na sucessão de quatro. Pois se Nabuco era Rey dos Assírios, quem o metia com o Império dos Persas, com o dos Gregos, com o dos Romanos? Quem? A obrigação do officio que tinha. Era Rey, quem quer conseruar o Reyno próprio hade sonhar com os estranhos”. Antonio Vieira, in Serman do Esposo da May De Deos S. Joseph.
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